VELHOS, ANACRÔNICOS OU OBSOLETOS?

Toda sociedade evolui e se transforma. Isto tanto é verdade quanto uma equação matemática.

No início da civilização, durante a formação dos primeiros agrupamentos humanos, nos sistemas sociais tribais dos primórdios da civilização, o homem sempre buscou um ordenamento jurídico para a convivência comum. Aqueles indivíduos que violavam as regras do grupo eram banidos.

Esses renegados, condenados a perambular pelo mundo, sem identidade familiar, sem tribo, mas ainda seres sociais, não raro encontravam-se e associavam-se, o Homem é gregário. Suas vicissitudes os aproximavam, ao mesmo tempo os embruteciam. Revolta, indignação e vingança são sentimentos que os unem e os organizam – constituem verdadeiros “exércitos de rejeitados sociais”.

Antigas lendas dão conta das invasões de aldeias pelas hordas constituídas pelos filhos renegados, que ao voltarem praticavam o parricídio, o rapto e o estupro e, na ausência do ordenamento jurídico, imperava a lei do mais forte, a dominação pela força física, pela brutalidade, a submissão dos mais fracos, a escravização, enfim, o império da barbárie.

Toda a História nos apresenta, sobejamente, exemplos de dominação e subversão – revoltas, guerras, conflitos sociais, golpes de estado, tudo a reboque da dominação histórica do homem pelo homem.

O que se vê hoje no Brasil é um golpe de estado bem mais desonesto e, pior, totalmente descompromissado de qualquer perspectiva de reconstrução institucional, é um golpe predatório e inconseqüente, cujo fim está em si mesmo – a perpetuação no poder – é uma profecia auto-realizável.

Ele tenta se escudar na “blindagem da bandalheira”, e pretende tornar inimputáveis pelos seus atos, mesmo em traição ao juramento Constitucional, os ocupantes das mais elevadas funções do Estado. E, na esteira dessa impunidade, oferece em perspectiva, como se fora uma fatalidade promíscua, a sagração do absurdo e a garantia da corrupção no paradigma de uma governança factóide.

O maior risco hoje no Brasil, é a dificuldade crescente de distinguir-se o bom senso daquilo que lhe é absolutamente incompatível. Risco que se aumenta e radicaliza pela dificuldade de identificar-se, de baixo até em cima, dentre os cidadãos e a classe dirigente, em que ponto se encontram no ‘continuum’ que vai da lucidez à insanidade, do erro pelo apedeutismo ao cinismo pela amoralidade. É sabido que, nestes últimos extremos, se conjuga o legado mais trágico da história ainda recente:

O súdito ideal do governo totalitário é aquele para quem já não exista diferença entre o fato e a ficção (isto é, a realidade da experiência) e a diferença entre o verdadeiro e o falso (isto é, os critérios do pensamento).” [ARENDT, Hannah - Origens do Totalitarismo. São Paulo, Companhia das Letras, 3ª ed., 1998]

Senão vejamos o artigo escrito por Dom Hélio Adelar Rubert – Bispo Diocesano de Santa Maria-RS:

A Grande Semana Santa
Muitos artigos escrevi e muitas palestras fiz ao longo dos últimos quinze anos combatendo certas frentes: as ideologias utópicas, a influência marxista na Igreja através da tal Teologia da Libertação, o apoio de muitos bispos e padres aos métodos revolucionários do MST e ao próprio PT, e as estratégias de ação desse partido. Reconheço que fui um chato de galocha, cumprindo, não sem padecimento pessoal, o papel missionário que a consciência política e a formação católica me impunham. Emitia opiniões num tempo em que não ser petista já constituía pecado grave e combater o PT era caso de excomunhão. Enfrentava apenas idéias, mas me tornei objeto da velha tática stalinista da difamação e das agressões pessoais. A carteirinha do PT era o oitavo e o mais efetivo dos sacramentos e negar que assim fosse constituía insuportável sacrilégio.
O Partido dos Trabalhadores se exibia como estuário de toda virtude nacional. No leque ideológico, só havia pecado a leste do PT, que cumpria, com furores de Torquemada, o papel de grande inquisidor das heresias políticas desalinhadas da beata esquerda tupiniquim.
E eu, do alto de minhas surradas tamancas, ousava dizer que não era bem assim.
Para zilhões de brasileiros, o PT e seus correlatos eram tudo. Encarnavam a decência, a inteligência acadêmica e a consequente solução para todos os problemas. Eram a locomotiva capaz de levar a classe operária ao paraíso. Havia invasões, atos criminosos, quebra-quebras. Distribuíam-se, a esmo, injúrias e difamações. Mas a moral revolucionária, para ser salvadora, não pode dar bola a pequenos valores burgueses do Estado de Direito. Ali estava, por fim, o partido da sociedade de massa, do Brasil urbano, opondo-se às práticas rasteiras e corruptas das elites rurais que costumeiramente cabresteavam, com pequenos favores, o miserável eleitorado dos grotões.
De tudo isso eu me lembro. E agora, olho para as pesquisas de opinião e vejo que é exatamente ali, nos grotões, à custa de farta distribuição de donativos, “bolsas”, vales e sacolões que Lula se entrincheira para o pleito de outubro.
A força da gravidade, inclemente, traz para baixo tudo que foi cuspido para o alto. A decência não resistiu ao menor contato com o pragmatismo. A inteligência não pariu um único projeto para o Brasil. Impôs-se o império da mentira.
Operário não viaja nem como pingente no vagão para o paraíso, que trafega lotado de banqueiros. E quem viver, verá: o sucesso petista na eleição presidencial depende do mais subalterno, desinformado e corruptível dos eleitores – aquele que pode ser comprado com favores oficiais.
Publicação: A Razão / Segunda-feira, 10 de abril de 2006.

(grifo nosso)

Nós estamos hoje à beira desse abismo. O atual estágio da crise político-institucional sinaliza para a aproximação de um ponto de não-retorno, em que a insanidade domina a consciência histórica e a irracionalidade tende a prevalecer. Será esta a nova sociedade brasileira, transformada pelo “lullismo”?

É importante prevenir-se, pois, como esse desfecho se costura nos equívocos e nas lacunas de um enorme desconjunto de intenções e decisões, flagrantemente malévolas, às vezes sob o manto ingênuo do “assistencialismo” ou simplesmente, e cinicamente, a justificar os meios pelo fim, tecendo a rede da sua inexorabilidade. Talvez assim, pela análise mais atenta de uns, pelo comportamento mais conseqüente de outros, enfim, pelo envolvimento mais cidadão de todos nós que participamos desse cotidiano e sofremos as suas conseqüências, seja ainda possível romper a blindagem da bandalheira, chamar a mentira pelo seu próprio nome, caixa 2 de crime e não de “recursos não contabilizados”, “mensalão” não é um “pequeno erro” mas corrupção mesmo, peculato, concussão, improbidade administrativa, responsabilidade, tráfico de influências, lavagem de dinheiro, criminosos não podem ser “perdoados”, não só porque não pecaram apenas, mas cometeram crimes, mas principalmente porque quem perdoa é DEUS, assim mesmo diante de um arrependimento fervoroso, o que parece não ser o caso, além do que a Divindade não está aqui na Terra, tampouco no Brasil e muito menos em Brasília. Em suma, eles têm que ser presos mesmo. Se não agirmos assim não se deterá a fatalidade da catástrofe, o caos social.

Caso contrário, a prevalecer o oposto, resta-nos perguntar a nós mesmos: estamos velhos, anacrônicos ou obsoletos? Se estivermos, corremos o risco de sermos descartados.

Por: ALEXANDRE, THE GREAT

7 comentários:

tunico disse...

Parabéns pelo dia de hoje, querida amiga!

Cleber Campos disse...

Feliz Dia Internacional da Mulher. Um beijo

Anônimo disse...

Forte o texto,SARAMAR. Confesso que fiquei assustado no inicio. Mas pra que??
É a nossa pura e dantesca realidade.
E ainda tem muitos avestruzes que não querem acreditar.

Beijão!!

antonior disse...

Olá, Saramar!

Infelizmente na minha idade já aprendi que não há poder sem abuso, corrupção, e tudo o resto senão nas teorias utópicas. Parece estar na massa estrutural do ser humano. Saúdo a bela construção conceptual deste "Alexandre, o Grande", cujo inspirador, contudo, também exerceu o governo do seu império com demasiados equívocos e fraquezas, mesmo na sua grandeza :-). Resta-nos espernear como as crianças (absentismo massiço, ou, melhor, voto nulo) ou tentar transformar o sistema e acabar engolido por ele. Desculpa a ironia, meio cínica, mas as minhas barbas já brancas e desencantadas escrevem isto.

Um beijo

Al Berto disse...

Olá Saramar:

Antes de mais parabéns pelo Dia da Mulher... apesar de achar que eles deveriam ser 365 ao ano.

Sobre o artigo :

...“O súdito ideal do governo totalitário é aquele para quem já não exista diferença entre o fato e a ficção (isto é, a realidade da experiência) e a diferença entre o verdadeiro e o falso (isto é, os critérios do pensamento).”

... perfeitamente de acordo, mas o problema é que esse tipo de súdito é crónico no Brasil há décadas, e não só nestes últimos anos.
Não fora isso e o Brasil nunca teria conhecido periodos tão negros como os que já conheceu, nem o seu povo se veria relegado para um analfabetismo generalizado.


A ironia disto tudo é agora esse analfabetismo e essa ignorância serem explorados em sentido contrário.

Bom fim de semana.
Um beijo,

Jorge Sobesta disse...

Saramar,

Esse texto me lembra um conto do Veríssimo, onde o papa e Átila o Huno travam uma conversa franca.

Grande abraço para você e o Alexandre.

Anônimo disse...

o homem ainda não aprendeu que para evoluir deve analisar os próprios erros